Direitos animais
Animais tem direitos? A resposta a essa pergunta dependerá do que entendemos por “Direito”.
Se
nosso entendimento for o de “Direito Animal”, ou seja, o conjunto de
legislações criadas pelo ser humano para estabelecer princípios e regras
para estabelecer de que forma devemos tratar os animais (direito positivo),
certamente concluiremos que animais não tem direitos, pelo menos não
nos mesmos termos em que seres humanos tem direitos. Isso porque em
nenhum lugar do mundo a legislação expressamente afirma que animais não
são propriedades ou que jamais devem ser explorados.
No entanto, se tomarmos por modelo o conceito de “Direitos Animais” ou “Direitos dos Animais”, ou seja, o direito natural, correto
e justo, que diz que todo animal deve gozar à vida e à liberdade,
independente do que diga a sociedade e sua legislação, concluímos que
sim, animais tem direitos.
Animais
tem direitos mesmo que as leis permitam sua exploração porque as leis
humanas estão sujeitas aos interesses do legislador. As leis estão
sujeitas ao espírito do tempo, à moral da época, aos limites
geográficos, à cultura de cada povo e ao seu prazo de vigência. Isso
resulta que o que muitas vezes está na lei contraria o que parece ser
razoável ou justo. Conclui-se então que muitas vezes a legislação não
goza de legitimidade. Como diziam os romanos “non omne quod licet
honestum est” (nem tudo o que é legal é honesto).
Animais
devem gozar de direitos universais, embora nenhuma sociedade humana
assim o reconheça. Esse é um direito que deve ser amplamente difundido e
reconhecido, contrapondo relativismos culturais e concepções
religiosas.
Em que se baseiam os Direitos Animais?
Seres
humanos e animais possuem interesses básicos semelhantes que podem ser
sintetizados nas idéias de preservação da própria vida, de sua
integridade física e de sua liberdade. A maioria dos animais, tal como
os humanos, são capazes de sentir dor, medo, frustração, fome... e da
mesma forma que consideramos imoral causar dor, medo, frustração ou fome
a um ser humano, assim devemos considerar em relação aos animais. É
claro que humanos e outros animais são diferentes, e as espécies animais
são diferentes entre si, mas estas diferenças não devem ser levadas em
consideração no que diz respeito a esses direitos básicos.
Negar
aos animais direitos básicos é questionar a validade de certos direitos
ao próprio ser humano, porque todo argumento que se contrapõe à
concessão de direitos aos animais pode ser também aplicada aos homens.
Por exemplo, diz-se que devemos respeitar todos os seres humanos porque
devemos respeitar nossos semelhantes; por outro lado, animais não são
nossos semelhantes, logo, facultamos a obrigação de respeitá-los, ou
respeitamo-os da forma que julgamos melhor. Se atualmente podemos
explorar animais porque eles são diferentes de nós, esta mesma
argumentação poderia (e em verdade o foi, no passado) ser utilizada para
explor
ar o ser humano. Homens se apresentam em uma variedade de formatos e
tamanhos, cores, habilidades intelectuais, nível social, há homens
considerados inválidos, homens que falam outras línguas, homens com
limitações físicas... Quem são realmente nossos semelhantes?
Se
os direitos humanos estivessem apoiados nas semelhanças entre os
homens, seria difícil fundamentá-lo, e muitos seres humanos poderiam ter
seus direitos negligenciados. Se o que nos torna sujeitos de direito é
uma alma, nossa crença em Deus, nossa linguagem, nossa auto-consciência
ou nossa inteligência, certamente muitos seres humanos não poderão gozar
de direitos por professarem outras religiões ou por simplesmente serem
ateus, por não falarem ou por possuírem limitações que não lhes permitam
terem auto-consciência ou serem inteligentes.
Por
outro lado, não podemos afirmar categoricamente que animais não
concebem a existência de divindades, ou que eles não possuem alma, até
porque esse é um conceito empírico que não pode ser mensurado. Animais
possuem sua própria linguagem, possuem muitas vezes maior capacidade
intelectual que muitos seres humanos e dão demonstrações de
auto-consciência.
Apesar
de todas as diferenças existentes entre os seres humanos, reconhecemos
que todos tem em comum os sentimentos, a vontade de preservar suas
vidas, integridade física e liberdade. O mesmo podemos dizer dos
animais.
A senciência
Dizemos
que todo ser que possua um sistema nervoso minimamente organizado é
capaz de perceber o ambiente à sua volta. Essa percepção torna sua
existência possível. Sem a percepção do ambiente os animais não
buscariam seu próprio alimento, não evitariam os perigos nem se
organizariam em sociedades.
A
sensação da dor nos animais evoluiu como um mecanismo importante para
sua sobrevivência; sem ela os animais se exporiam aos seus predadores,
ao invés de fugir deles. Logo, sabemos que, à semelhança do ser humano,
animais de fato experimentam sensações desagradáveis e tendem a
evitá-las. Se tais sensações de fato existem, não parece justo
proporcioná-las.
De
igual maneira, se animais evoluíram para viver de determinada maneira,
seguindo seus próprios instintos. Forçá-los a viver de maneira contrária
à sua própria natureza é, em si, causa de sofrimento. Por esse motivo o
próprio confinamento do animal, sua submissão ao trabalho ou a
alteração de seu modo de vida são contrários aos seus direitos.
A
senciência, ou seja, a capacidade de sentir, é o que diferencia a
maioria dos animais dos vegetais e dos minerais. Por esse motivo falamos
em direitos animais mas não falamos em direitos vegetais e direitos
minerais. Animais, como os seres humanos, são criaturas sencientes, e da
mesma forma que temos obrigações morais para com um, temos para com
outro.
Consideração de interesses
Com
base no conceito de senciência entendemos que animais possuem seus
próprios interesses, sendo que os principais deles são: Continuarem
vivos, evitarem sensações desagradáveis e viverem de acordo com sua
natureza. Contrários a esses interesses são o abate de animais, seu
aprisionamento e sua submissão a atividades contrárias à sua natureza.
Animais
não existem para satisfazer aos interesses humanos e não podem ser
considerados propriedades humanas. Qualquer idéia que contrarie os
interesses dos animais, ou seja, que os reconheça como propriedade ou
como meios para nossos fins, é contrária aos Direitos Animais.
Bem-estarismo e exploração animal
A
principal força opositora aos direitos animais encontra-se no movimento
de bem-estar animal. Embora esse movimento carregue “bem-estar animal”
no nome, bem como uma retórica elaborada de modo a aparentemente
promover os interesses dos animais e o humanitarismo, esse movimento se
caracteriza pelo especismo e utilitarismo e tem como propósito
implementar formas mais eficientes de exploração animal e não seu fim.
Não, é, portanto, um movimento que se preocupa em preservar os
interesses dos animais, mas sim na continuidade de sua exploração.
A
maior parte dos movimentos e indivíduos que dizem promover os direitos
animais e o vegetarianismo em verdade promovem o movimento de bem-estar
animal, não sendo os interesses dos animais sua prioridade, mas sim sua
exploração institucionalizada e sistemática.
Dessa
forma, de acordo com o movimento bem-estarista, o erro não está em
matar animais para comer, mas sim na forma como esses animais são
criados e mortos; o erro não está em utilizá-los em experimentos
científicos, mas na forma como eles são mantidos em laboratórios e
utilizados nos experimentos; o erro não está em domesticá-los para
fazê-los trabalhar, mas em submetê-los a horas excessivas de trabalho.
Não
é obviamente um movimento que atende aos interesses dos animais, mas
sim aos interesses daqueles que os exploram, pois essas pequenas
modificações de processo apenas tornam a exploração animal algo mais
aceitável pela sociedade. Além disso, produtos advindos dessas outras
formas de exploração tendem a ser mais valorizados e o que pode parecer
maior custo é na verdade investimento.